[esquemaNovo]

Versão virtual da coluna [esquemaNovo] sobre música pop, produzida por Thiago Pereira e Terence Machado e publicada, todas às quintas no jornal "Hoje em Dia".

Nome:
Local: Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil

Pai, católico não praticante, taurino (por teimosia, hehehe), cruzeirense não ortodoxo, ainda jornalista, ex-baterista com recaídas frequentes, ciclista "pós-amador".

quinta-feira, setembro 30

[nº 8 - O vídeo matou as estrelas do rádio?]



Se desde o início dos anos 80 o Buggles saudava a chegada da MTV com o hit “Vídeo Kills The Radio Stars”, era possível prever a mudança de foco que a era do vídeo causaria na música pop. “Nossa, mas que papo mais velho!” diria outro. E é mesmo, afinal pelo menos duas gerações já consomem música pop pautadas em som e imagem.Com a extinção do mercado de singles no Brasil, o videoclipe passou a se tornar o referencial máximo para o lançamento das famigeradas músicas de trabalho. Isso, claro fazendo um recorte de público (cada vez maior) consumidor que tem acesso ás mídias que oferecem o produto videoclipe - não a linguagem, esta cada vez mais presente em outras produções.

Talvez o problema esteja na concepção desde o início, ou talvez seja puro romantismo de minha parte, mas não consigo deixar de pensar em uma coisa: o que poderia servir como espaço para novas tendências, correndo paralelamente (ou melhor, complementarmente) ao meio tradicional, já estabelecido -o rádio- se tornou mera repetidora de um sistema competitivo voraz. Hoje não precisa ligar o rádio, basta ligar a tv e o play list das mais tocadas vai estar presente sob a forma de imagem, efeitos cinematográficos, poses, enfim o pacote completo. Já está pronto, formatado inofensivamente, um fast food que oferece diversas opções para diversas necessidades: da explosão hormonal masculina (a libidinosa Britney Spears, o rock machinho do Charlie Brown Jr e seus respectivos genéricos) ao romantismo popularesco disfarçado de super produção do KLB e do Alexandre Pires.

De certa forma, em formato videoclipe, a música perde um pouco o fator fantasia, a capacidade que ela têm de ativar o imaginário do ouvinte. “Nossa, que papo mais careta!”. E é mesmo. Mas Renato Russo - que além de gênio entendia muito de música pop - tem uma declaração lapidar: “Música pop é isso: você está lá, sentado a beira do caminho, completamente desolado e de repente toca aquela música do Gilliard, dizendo exatamente o que você está sentindo!”. Quer dizer, no rádio ainda é possível roteirizar a música de acordo com cada situação – ela é móvel, não estática, não está padronizada.

“Ah, mas eu não me preocupo mais com rádio, eu tenho meu I-Pod, meu computador banda larga, meus contatos onde posso conseguir quase instantaneamente o single novo daquela banda alternativa da Zâmbia...”. Parabéns para você, que tem uma boa grana e sede de informação. Engraçado: a relação é quase sempre através da negação, da substituição. Será que as mídias não podem mesmo se complementar? O mesmo serve para a relação videoclipe/rádio. A questão não é negar todas as maravilhas oferecidas por este formato, imagina, basta assistir a um clipe como “Just” do Radiohead para notar o potencial artístico do clipe. Até porque não foi o vídeo que matou o rádio não. Minhas principais suspeitas recaem sobre o próprio rádio, que seguiu fielmente as regras mercadológicas e não soube dar seu salto, sua sobrevida. Se o videoclipe consegue ousar, na programação de rádio atual que há variação do cardápio, uma “previsibilidade” tediosa. “Mas qual seria a salvação para o rádio então?”. Uma dieta mais apimentada? Mais dinheiro? Um milagre? Sinceramente eu não sei. Mas de uma coisa eu tenho certeza: sempre vai ter alguém na sarjeta, esperando aquela música que, hoje em dia, do rádio não vêm. (TP)

[velho esquema]
Ramones “Rocket To Russia” (1977)


Enciclopédia da música pop, clichê número sete: o punk salvou a música nos anos 70, antes atrelada aos teclados de Keith Emerson, ao rock adulto do Bread, as limusines dos grandes astros, as fantasias de Elton John, cocaína, produções auto centradas.Verdade? È pode ser.

“One, two, three, four...”. A contagem é apenas uma das marcas registradas, assim como as jaquetas de couro, os óculos escuros e o rock adrenalínico. Existe fetiche maior que esse para um púbere ilhado entre as desgastadas fórmulas do rádio ou o cabecismo vigente dos meios intelectuais? Sim, porque o ambiente que motivou o surgimento dos Ramones pode encontrar comparações em qualquer época: pense nos anos 70, com a discotheque da gostosona da sala e o rock progressivo dos viajandoês mais velhos da rua, nos 80 com o pop perfumado de Huey Lewis que encantava a irmã mais nova, nos anos 90 com Chico César embalando as festinhas da mamãe. Estereótipos? È pode ser.Mas, muito além da hum,filosofia “segundo verso, igual ao primeiro”( de “Judy Is A Punk”) o corte radical do quarteto está em reescrever a bíblia do gênero fielmente, adicionando apenas novos cenários, drogas, musas... De resto é apenas rock n´roll. Assim como eram os experimentos quase minimalistas de Chuck Berry, de Buddy Holly, dos primeiros passos dos Beatles, dos Stones, dos Beach Boys. Os Ramones apenas transportaram esta, hum, essência para suas realidades.

“Rocket To Rússia” é exemplo ímpar da imensa discografia dos caras não por ser um disco de transição para a banda, não por eles terem se conectado com um de seus maiores ídolos (como em “End Of The Century”, produção de Phil Spector), não por estar atrelado a alguma tragédia. È simplesmente o melhor álbum do grupo, onde toda a crueza particular na sonoridade da banda encontra ganchos pop infalíveis, e o resultado disso são pérolas (não) lapidadas como “Teenage Lobotomy”, “Locket Love” e a suprema “I Don´t Care” (“...about the world, about that girl...). Se no mesmo período os Sex Pistols adicionavam escândalo, política e raiva ao “faça você mesmo”, os Ramones compuseram verdadeiras elegias á diversão inconseqüente, aos amores juvenis, ao suor e a cerveja, a juventude enfim, reduzidas a três acordes em um disco impecável. O punk norte americano da década de 70 era isso, a descerebração herdada dos New York Dolls e dos Stooges sem as maquiagens, sem as pretensões de se tornar um superstar ou fundir sua música a outros ritmos. A cover de “Surfin' Bird” dos seminais Trashmen, não esta ali á toa: “Bird, Bird, Bird is a word( repetir x vezes)”. É isso aí.

Um, dois, três...Bastaram três anos para os membros originais falecerem, Joey devido a um câncer, Dee Dee (uma iconografia tão importante ao gênero quanto seu fã Sid Vicious) devido a uma overdose e Johnny, no último dia 16.Morre também um pedaço da história do rock. Que felizmente ressuscita, pelo Jesus And Mary Chain, pelo Nirvana e pela tal próxima banda que irá salvar o mundo, blá, blá, blá. Porque essa foi a maior lição apresentada pelos Ramones.Verdade? È, pode ser. Mas, sinceramente, pergunte para algum fã se essa suposta importância histórica é a principal motivação para se amar “Rocket To Rússia”. Eu aposto o resto da minha coleção que a resposta vai vir como uma contagem: “One, two, three, four...”.(TP)

[espaço HD] por Carol Rausch >> relações públicas e produtora cultural

Cachorro Grande, “As próximas horas serão muito boas”
Rock na veia, na cabeça e nos ouvidos! Considero uma das melhores bandas surgidas nos últimos tempos. O disco é super divertido e fiel ao bom e velho rock. Sem firulas ou deslizes eletrônicos o disco é para escutar e cantar no volume máximo!

Tom Bloch, "Tom Bloch”
Não consigo tirar o disco do som e quando tiro fico cantarolando o refrão de “Nossa Senhora” e outras musiquinhas bacanas. É tão bom que a gente até esquece que o Pedro, vocalista e autor da maioria das letras, é filho do Luís Fernando Veríssimo. Na verdade, isso nem importa.

“Almoust Famous Soundtrack”, Vários
Trilha sonora de “Quase Famosos”, um dos filmes mais bacanas sobre a santíssima trindade do rock...Para os apaixonados pelo estilo o disco é aquisição obrigatória, assim como o dvd. É impossível cantar “Tiny Dancer “de Elton John e não lembrar da, “prematuramente clássica”, cena do filme.

e-mail: colunaesquemanovo@hotmail.com

sábado, setembro 25

[nº 7 - “Queimar ou não queimar: é essa a questão”]



Uma das grandes lições apresentadas por Arnaldo Baptista e Brian Wilson em seus novos trabalhos é que não existe uma chave para desvendar o mistério acerca da condição humana. Principalmente quando esta se confunde com a arte, onde o envolvimento do artista com suas criações representa o esfacelamento da própria vida.

Arnaldo é o autor de um dos maiores tratados sobre a desilusão da música popular. Seu “Loki” (1974) expõe o músico encarnando fielmente em versos cortantes o anjo exterminador da mitologia greco/romana que inspirou o título do trabalho. Era o fim dos Mutantes, era o fim do sonho derretido em ácidos e amor livre, era o fim do romance com Rita Lee. E principalmente era o fim de uma era onde ser todos “uma pessoa só” não era lamber a utopia, era realiza-la nitidamente em forma de arte. Quando canta “você me disse adeus/Mas como, se somos todos de Deus” (“Desculpe”), deixa clara sua inadequação aos novos tempos. Inadequação esta que iria o acompanhar até a noite de 31 de Dezembro de 1981, quando pulou do terceiro andar do hospital onde estava internado.

Brian Wilson é o autor de um dos maiores tratados sobre a desilusão na música popular. Seu “Pet Sounds” (1966) é fruto direto da sua paranóia e frustração.Impulsionado por uma obsessão doentia com a riqueza musical apresentada em “Rubber Soul” dos Beatles, e guiado por traumas de infância não resolvidos, Wilson tomou como meta realizar um trabalho ainda mais ousado, passando adotar níveis de exigência sobre humanos. Isso significava dias solitários ao piano movido a drogas, absolutamente centrado em si mesmo e em seus fantasmas. Apenas a faixa de encerramento “Caroline No” se faz necessária para reduzir a pó toda a Califórnia dourada e banhada em esperança juvenil que guiava a obra de sua banda, os Beach Boys, desde então: “Para onde foi os seus longos cabelos/ Onde está a garota que eu conhecia?”. Outra faixa, “I Just Wasn´t Made For This Times”resumia bem a inadequação de Wilson aquele tempo. Inadequação esta que iria o acompanhar por mais de vinte anos em diversas internações, tentativas de suicídio, brigas judiciais e tragédias constantes.

Muitos não sobreviveram a aventura: de Nick Drake a Eliott Smith, Kurt Cobain e Renato Russo, Caio Fernando Abreu, Sylvia Plath...A lista é grande e representativa, poeticamente traduzida por Neil Young nos imortais versos de “Hey Hey, My My(Out Of The Blue)-é melhor queimar do que desaparecer. Venhamos e convenhamos: fazer da própria trajetória um espelho para sua criações ( e vice e versa) demanda uma certa capacidade de transitar pelos sempre perigosos caminhos entre a sanidade e a loucura, o racional e o passional, o amor e ódio. Que estes representam elementos vitais, imprescindíveis ao ser humano, ninguém, duvida. Mas o custo de se enfrentar o perigo frente a frente pode sair caro demais.

São poucos, como Arnaldo Baptista/Brian Wilson que tiveram a graça concedida de conseguir retirar do veneno o próprio antídoto. “Let It Bed”(de Arnaldo) e “Gettin´In Over My Head”( de Wilson), ambos lançados este ano, trazem, além dos seus sintomáticos títulos, a inadequação de seus autores transformadas em força vital. Nenhum dos dois trabalhos carrega a explosão criativa dos citados anteriormente, mas recolhem os cacos de duas trajetórias que, se quase perderam a vida pela arte, também por ela ressuscitaram. Se fizeram obras paridas da dor, deram a luz também a trabalhos que comprovam a beleza que é nascer de novo. Trazendo para si e subvertendo o célebre mote shakespeariano, Arnaldo sumariza: “To burn or not to burn/What´s the question?”. Brian provavelmente concordaria.Sorte nossa, como espectadores, poder acompanhar o dilema. “Louvado Seja Deus, que nos deu o rock n´roll”, canta Arnaldo. Louvado seja.(TP)

[velho esquema]
Ocean Colour Scene “Moseley Shoals”




Enquanto a Grã-Bretanha se dividia entre a popularidade e os hits de Blur e Oasis, em meados da década de 90, um grupo corria por fora do burburinho do showbusiness pra formatar um dos grandes discos do rock inglês (muito mais do que Brit Pop) daqueles tempos. Com timbres e levadas da melhor linhagem folk, riffs de guitarras herdados do blues e da grande era roqueira - os saudosos anos 60 - o Ocean Colour Scene disse, musicalmente, tudo o que precisava em “Moseley Shoals”.

Após uma estréia um tanto quanto tímida, a banda apareceu com esta jóia que logo virou referência para tudo o que ela própria faria adiante. No Brasil, apenas um dos petardos do cd chegou a tocar em algumas rádios - a eletrizante “Riverboat Song”, que abre uma seqüência arrasadora. “The Day We Caught The Train” vem, literalmente, colada à faixa de abertura e vai a fundo no resgate da sonoridade do Fab Four, em sua fase mais experimental. A belíssima “The Circle” não fica devendo nada para as famosas pérolas dos irmãos Gallagher. Duas baladas garantem momentos de refresco e ainda maior deslumbre, entre as seqüências ásperas e distorcidas do álbum: “Lining Your Pockets” e “It’s My Shadow”. E o blues “Get Away” começa arrastado, em voz e violão, pra explodir em acordes poderosos no final.

Fica difícil aturar a antipatia e o tom carrancudo da dupla de frente do Oasis, quando se descobre um verdadeiro oásis como este “Moseley Shoals”. Ao invés de compor de cara amarrada e ainda fazer disso uma estratégia de marketing poderosa, o OCS preferiu criar suas composições sorrindo e, neste caso, foi bem mais feliz, naturalmente. (T.M.)

[espaço hd] por Carolina Diamante >>produtora do programa Microfonia da PUC TV dá suas dicas:

Eddie, "Original Olinda Style"
a banda pernambucana tem um som bem dançante e que engloba muito da cultura da região.

Radiohead, "Ok Computer"
Não é à toa que este álbum foi considerado como um dos melhores de todos os tempos.

Mano Chao, "Clandestino"
é um som muito gostoso de escutar, as músicas deste cd ficam na cabeça.

quinta-feira, setembro 16

[nº 6 - "TiMs e Bens e tais"]




Quem sempre guarda um troco para o que podemos chamar de “turismo musical” terá a oportunidade única de comprar um pacotaço de fim de ano: uma viagem sonora chamada Tim Festival. Com a programação, finalmente, fechada e divulgada, a segunda edição do evento, que é a continuação natural do velho Free Jazz, terá três diárias e tanto, com estrelas do primeiro time do pop internacional, distribuídas no variado roteiro nacional. Isto, fora as atrações voltadas mesmo para o jazz.

Primeiro surgiram boatos em torno da mais nova mania punk inglesa – The Libertines. O grupo acaba de lançar o segundo álbum, com produção do ex-Clash Mick Jones. O cd de estréia chegou ao Brasil pela Trama. Pois agora, no dia 7 de novembro, por volta das onze da noite, no palco Tim Lab, o som “da resposta britânica aos Strokes” será colocado à prova para os brasileiros. Em disco, pelo menos no primeiro, os Libertinos deixam a desejar como várias das provações e provocações que levam o “carimbo” hype. O Rapture cumpriu este papel no festival no ano passado. E ai deles, se não fossem duas ou três boas músicas do cd “Echoes”, entre elas, a pulsante “House of Jealous Lovers”.

A aguardada lista de artistas convocados para a empreitada ficou ainda melhor com o anúncio da escalação do Primal Scream, liderado pelo cabeção Bobby Gillespie. Mesmo alguns anos além do auge vivido pelo grupo, nos tempos do aclamado “Screamadelica”, de 91, tem tudo para ser uma experiência e tanto conferir por aqui a mistura psicodélica e dançante de rock, soul e eletrônica da “guarda de Sir Gillespie”. Por falar em eletrônica, os papas do estilo, os alemães do Kraftwerk, retornam ao Brasil, após lançarem o recente “Tour de France”. E diante do pioneirismo do Kraftwerk, nesse terreno, o Pet Shop Boys terá de compensar a balança a seu favor à base de vários sucessos radiofônicos, enquanto o 2ManyDJs com certeza deve estar preparando um set hipnótico para dar boa mostra do que há de contemporâneo na leva musical computadorizada!
Longe dela, uma boa surpresa pode ser a apresentação dos Picassos Falsos, que reaparecem sete anos após os louros não colhidos na prática do acertadíssimo “Supercarioca”, lá em meados da década de 80.

E pra fechar, no melhor estilo, o calendário dos turistas da música, em 2004, PJ Harvey e Brian Wilson surgiram como ofertas mais do que surpreendentes. Só dois artistas desse quilate poderiam tirar os amantes da boa música da nostalgia delirante, principiada em Curitiba com o show do Teenage Fanclub e Pixies, e continuada com Ian McCulloch, numa turnê por cinco capitais brasileiras, e a Orchestra Morphine, em apresentação inesquecível no festival Tudo é Jazz, na charmosa Ouro Preto.
Pensando bem, como é bom que existe a música pop e nem tudo é jazz. Nem o Free (Jazz), que virou Tim Festival, nem mesmo o evento de Ouro Preto, apesar do nome. Quer melhor exemplo que o da Orchestra, que agora faz tributo ao ex-líder do trio liderado por Mark Sandman, ter conseguido tirar da anestesia o público presente na pequena cidade histórica? Ou, como indagaria Caetano, será que “apenas os hermetismos pascoais e os tons e os miltons, seus sons e seus dons geniais nos salvam, nos salvarão dessas trevas e nada mais?”

A salvação parece ter começado com o pacto lendário e nada santo feito por um bluesman, numa certa encruzilhada. Bem que Raul avisou: “o diabo é o pai do rock”. Então, chapados com o Morphine daquela Orchestra que, em vários sopros, subverteu a estética do jazz, vamos todos curtir PJ Harvey e abrir um grande sorriso ao final! É que Brian Wilson dos Beach Boys está a caminho para nos apresentar os alucinógenos presentes naquele “Smile”! (T.M.)

· Para conferir a programação completa do Tim Festival 2004 acesse: www.timfestival.com.br


[velho esquema]

Jorge Ben “A Tábua de Esmeraldas” (1972)



Jorge Ben é uma espécie de eminência parda da MPB: festejado por todos os outros grandes nomes como Caetano Veloso e Milton Nascimento, mas dono de discreta trajetória junto ao grande público. Não é muito difícil de entender: ele sempre se situou como um corpo estranho - mas nem por isso mal recebido – na cronologia da música popular brasileira. Uma terceira margem cuja mistura de "samba com maracatu" não era bossa, não era uma brasa, não era proibido proibir.Falamos aqui do Ben, não confundir com o Benjor: apesar de algumas fagulhas, este último está longe de alcançar o fogo do primeiro. A obra de Jorge anterior a formação de sua Banda Do Zé Pretinho (eficiente nosbailoes a que se propõe, mas notadamente pouco ousada)é brasa que ainda queima, onde encontramos os desenhos mágicos do seu violão, a simplicidade poética de seu texto, o lirismo doce de suas musas.

O pulo do gato de Babulina era a ponte radical entre o violao gilbertiano e as batidas suingadas oriundas do rock, contruída por um dos maiores mistérios da mpb: a mágica mão direita de Jorge, mão em que ele palhetava suas batidas no violao. E o violão de Ben desenha jazz, maracatu, samba e outras bossas mais. É fonte que não seca: a classificação de sua música é tão absurda quanto o espectro de músicos que influenciou - das baladas folk arcadistas de Nando Reis ao rap emcarne viva dos Racionais MC’S. Em "A Tábua De Esmeraldas", o salto foi mais alto: o disco é seguramente uma das obras mais desconcertantes da música popular brasileira, e assim como o disco de estréia de Ben (o didático "Samba Esquema Novo"), estabelece alguns parâmetros até então inéditos nesta. O cotidiano banal vinha em cores bonitas sob a ótica de Ben: o "Namorado Da Viúva", "O Homem Da Gravata Florida", narrativas que resvalam no absurdo em sua simplicidade. O habitual romantismo brota da pureza ("Minha Teimosia", de harmonia semelhante a "Lay LadyLay", de Bob Dylan), do desejo carnal ("Menina Mulher Da Pele Preta"), da urgência ( na sublime "Cinco Minutos"). O misticismo. Faz também política, seja no pacifismo popular de "Vou Torcer", seja na épica eengajada "Zumbi". O misticismo que (des)norteia o disco bate bonito em "Os Alquimistas Estão Chegando" e na louvação "Brother".Mas alcança seu ápice mesmo no dubbismo de "Errare Humanum Est" ("E de pensar que não somos os primeiros seres terrestres/ Pois nós herdamos uma herança cósmica/Errare humanum est"), que é onde está a chave para se perder nesta tábua repleta de esmeraldas. Assim com o alquimista francês Flamel que ilustra a capa do disco, Jorge Ben fez da tábua de esmeraldas sua pedra filosofal: tudo aqui é ouro.(T.P.)

[espaço hd] por Fernanda Azevedo >> ex-produtora da Motor Music e assessora do Café com Letras

Valv, "The Sense of Movement"
Indie rock de primeira, na linha de bandas como Placebo e Idlewid. Primeiro disco da banda mineira, com 12 músicas e participações especiais, entre elas, Fernanda Takai, do Pato Fu.

Romulo Fróes, "Calado"
Música de qualidade em português. Canções acústicas e delicadas, com letras tristes e voz suave, que unem a típica tristeza do samba à discreta melancolia de grupos como Low e Red House Painters

System of a Down, "Steal This Album"
Álbum imperdível do quarteto californiano de metal, que presenteia os fãs com uma seleção de canções inéditas, jamais lançadas pela banda anteriormente. O destaque, fica por conta da faixa "Boom!", que ganhou video clipe dirigido por Michael Moore.

quinta-feira, setembro 9

[nº 5 - Enquanto a mídia não é democrática, a música pode ser independente]



“Independência ou morte!”. Se no plano político, o célebre mote de D. Pedro I não encontrou até agora sua razão na prática, é possível pensar no jargão ao analisar a indústria musical brasileira atualmente. Claro que as duas coisas( indústria e política) são dissociáveis, mas é possível encontrar caminhos paralelos ao tradicional esquema de funcionamento do mercadão. São justamente estas vias marginais que renovam e diversificam a música popular brasileira, afinal, se a única música disponível no mercado fosse a fabricada nas grandes gravadoras - salvo poucos exemplos- poderíamos estar diante do juízo final. Pode parecer uma visão negativa, mas justificada hoje pela limitação criativa e pela covardia das grandes mídias em oferecer ao público um fast food musical tão sem gosto quanto previsível. Uma fidelidade explícita as regras do mercado, que se reflete no jabá, nas bandas “genéricas” , nas celebridades instantâneas, entre outros.

A questão é: independência pode significar democracia, traduzida como a possibilidade do maior número de pessoas terem acesso a uma diversidade musical que existe para ser explorada, desde que esta esteja disponível para o público. Enquanto isso não acontece, existe a opção do músico, do público e até mesmo das gravadoras, entre se sentirem reféns ou fazerem seu próprio cardápio. Escolhida a segunda opção, a independência existe sim, para os que se propõem a fazer música sem concessões ou fórmulas. O que não significa elitismo ou incapacidade de se comunicar com o grande público: é possível que seja apenas honestidade com o próprio trabalho, atitude que muitas vezes é interpretado, brasileiramente, como “coisa de otário”. A independência também está nas pequenas gravadoras e selos, que antes de serem exageradamente categorizadas como suicidas ou heróicas, podem ser vistas apenas como profissionais. Gente que consegue produzir muito, com pouco dinheiro ,mas com fartura de idéias, e que em alguns casos consegue se equiparar seus produtos em qualidade técnica às majors. E, principalmente a independência do público em relação as grandes mídias, que se reflete na busca de novas informações e naturalmente, consumi-las.

Com isso, fecha-se um círculo que, aos poucos, pode sobreviver “constrangindo o mercadão”, como já afirmou Lobão , um dos bem sucedidos exemplos de uma trajetória que hoje segue, a seu modo, paralela à indústria. Talvez seja isso mesmo: a independência pode não ser a solução - ingenuidade pensar que os privilégios concedidos por uma grande empresa( como divulgação) podem ser ignorados- mas, por hora, é um bom veneno para a monotonia vigente no mundo das majors . Veneno este que pode ser ignorado agora, mas que, cedo ou tarde, terá de ser percebido. A partir daí, o jogo pode mudar. (TP)

[velho esquema]
Stevie Ray Vaughan And Double Trouble
“Coundn’t Stand The Weather”



Em qualquer discoteca respeitável, você encontra uma seção destinada aos mestres da guitarra. Com certeza, lá estarão discos de Jimi Hendrix e Eric Clapton. Indo um pouco além, é possível que um ou mais álbuns do texano Stevie Ray Vaughan também estejam na prateleira. Se a coleção for de algum guitarrista, “Couldn’t Stand The Weather” aparecerá em posição privilegiada. Tão à vista, quanto outros dois primores de Stevie – o debut “Texas Flood” e o derradeiro “In Step”. Mas, entre as duas extremidades da sua discografia, este shaman do instrumento conseguiu estreitar a comunicação espiritual com Hendrix, em “Couldn’t Stand The Weather”.

O ritual guitarrístico começa na abertura instrumental “Scuttle Buttin’”, que todo mestre das seis cordas desejaria ter feito. A faixa-título vem em seguida, anunciando a tempestade que se aproxima. O espírito do velho Jimi baixa de forma acachapante, nervosa, beirando um surto epilético, na clássica “Voodoo Chile(Slight Return)”, num dos raríssimo casos em que a reinvenção chega a um patamar próximo da original. Pronto! A cerimônia alcançou seu ponto mais alto. Depois de evocar, receber e transmitir as energias daquele que foi pro além carregando o título de “o melhor guitarrista de todos os tempos”, Stevie Ray Vaughan ainda conduz “Cold Shot”, um shuffle arrastado, genialmente bluesy. E pra todo mundo entender porque o texano foi um dos mais iluminados, principalmente, no território blues, ele ainda destila as notas e os acordes sofridos da sublime “Tin Pan Alley” e seus contagiantes nove minutos e dez segundos. Para um disco que começou com um rock instrumental inspiradíssimo e passou por tantos momentos mágicos, um jazz discreto cai bem pra encerrar a seqüência.

Um talento do tamanho de S.R.V. só poderia mesmo ser interrompido por uma estupidez qualquer como uma overdose ou, aqui no caso, uma montanha artificial para prática de esqui no gelo não prevista na rota do helicóptero destinado a levar pra casa Eric Clapton. Como sacrificar o “deus da guitarra” poderia ser a maior das heresias, o destino preferiu mostrar o caminho das nuvens para Stevie.(TM)





quinta-feira, setembro 2

[nº 4 - O “Novo mundo” dos Picassos Falsos]



Passada a euforia do rock brasileiro, nos anos 80, as gravadoras começaram a puxar o freio de mão, os discos e apostas em novas bandas foram escasseando e algumas delas acabaram numa espécie de limbo, mesmo com seus discos nas prateleiras e, às vezes, tendo recebido boas críticas da imprensa especializada. Uma que acabou especialmente prejudicada por esse declínio do mercado roqueiro no Brasil foi o Picassos Falsos. Os cariocas tinham lançado o primeiro disco pelo selo Plug da RCA – BMG, atualmente – em 1987, conseguindo relativo sucesso com uma das faixas do álbum de estréia, o funk pop “Quadrinhos”. No ano seguinte, o grupo mostrou um dos melhores discos do pop nacional feitos na segunda metade daquela década - “Supercarioca”. Era fácil perceber o amadurecimento precoce dos Picassos de um disco para o outro, principalmente, no que diz respeito ao tratamento sonoro. O esporro elétrico do primeiro disco foi convertido no orgasmo acústico do sucessor. As letras estavam ainda melhores. A pegada rock aparecia de cara e, por que não, apenas com a voz nervosa de Humberto Effe e o pandeiro da faixa de abertura “Retinas”. Os acordes ficavam ainda mais calorentos, adiante, com as batidas de violões e violino incandescentes de “Verões”. O “Rio de Janeiro” desmoronava após a chuva, num samba rock inspiradíssimo e do “Ben”. Salve Jorge e os Picassos Falsos! Estas e tantas outras composições do memorável segundo disco do quarteto, no entanto, ficaram meio que esquecidas no elo perdido, entre duas metades distintas e, aparentemente, distantes dos anos 80.

Foram quinze anos fora de cena e o Picassos ressurge agora com o terceiro trabalho e um “Novo Mundo” pela frente. Pelo menos é o que sugere o título do cd. Torna-se perceptível, logo numa primeira audição, a grande novidade acerca deste retorno da trupe “supercarioca” – a banda adentrou a mpb e deixou o rock, quem sabe, pra outra hora. Se antes, versos do sambista Ismael Silva eram enxertados na levada psicodélica de “Carne e Osso” e o reverso acontecia com “Third Stone from The Sun” de Jimi Hendrix, em “Bolero”, distorcendo qualquer sombra de brasilidade; agora Ismael, de novo ele, aparece diluído não em guitarras, mas nas batidas pré-programadas da releitura de “Me Diga Seu Nome”. No carnaval 2004 do “Grêmio Recreativo Picassos Falsos”, a “Porta-bandeira” é a segunda a entrar na passarela, numa boa parceria do vocalista Humberto, com Dé ex-baixista do Barão. Aliás, esta dobradinha rendeu duas das melhores músicas do disco, a outra é “Zig Zag 2” – samba sofisticado com adereços jazzísticos. E é à base de jazz que o Picassos, literalmente, faz “O Filme”, ou melhor, um curta-metragem de bom gosto. Não dá pra dizer o mesmo da faixa-título, na qual eles quase queimam o filme, aproximando-se de um roteiro qualquer de Zeca Baleiro. Mas onde foi parar a veia rock e experimental de outrora? Em pitadas discretas, no baião “Presidente Vargas” e em “Eletricidade”, faixa que fecha o disco sem dar choque em ninguém.

A constatação de que, mesmo hoje, “Supercarioca” seja mais moderno e revelador que o novo cd leva à seguinte conclusão: antigamente, os Picassos Falsos eram uma excelente banda de rock, desnorteando o samba. No “Novo Mundo”, eles são ótimos sambistas, desnorteados no rock.

[velho esquema]
TREAT HER RIGHT - “Tied To The Tracks” (1989)


Quando morreu em cima do palco em Palestrina, Itália, fulminado por um ataque cardíaco enquanto executava a sintomática “Super Sex”( “Taxi!/Taxi!/!Hotel!/Hotel!/I got the whiskey baby, i got the whiskey/ I´ve got the cigarettes...”), Mark Sandman levava consigo também uma obra particular que corria paralelamente à música vigente na época. Na metade dos anos 90, quando o pop estava extremamente derivativo, o Morphine era uma espécie de gota pura em um oceano de ruído, uma banda que conseguiu imprimir uma marca pessoal tão profunda quanto suas densas músicas. Assim como o ópio que serviu de inspiração para o batismo da banda, a mescla de bateria ,sax e baixo tinha a rara capacidade de sedar ouvidos mais combalidos, transportando o ouvinte para um universo liricamente barra pesada, mas embalado por uma música extremamente agradável , baseada naquilo que o próprio Sandman classificou como low rock- uma sonoridade em que o barulho vinha em baixos teores , e a instrumentação era esparsa e elegante.

O Treat Her Right foi o laboratório paras as experimentações de Sandman, que viria ajudar a formatar o som que fez sua fama anos mais tarde. “Tied To The Tracks”, segundo e derradeiro disco da banda , é Sandman de melhor safra, servido puro, sem gelo. Dividindo as composições com David Champagne, líder e fundador da banda e contando com o apoio do baterista Billy Conway, que iria acompanhá-lo no Morphine, a voz grave de Mark, filtrada em nicotina e álcool, vai tecendo climas ideais para ambientar uma hora vagabunda, regada a sexo, drogas e emoções baratas. Sempre sob o signo do blues, as composições aqui são pautadas em slide, gaitas e linhas econômicas de guitarra. Entre canções assustadoramente premonitórias, como “Picture Of The Future” (“Este é um retrato do futuro/ E você não está nele”), se destacam faixas que trazem marcas registradas de Mark, como a morbidez romântica de “Marie” e o groove sensual de “Junkyard”. Acima de todas elas, a obra –prima “No Reason”, coda perfeita para aquela inútil noite italiana de 99: “Não há razão nesta vida/ Alguém vive e alguém morre/ E isto não deveria vir como uma surpresa”.

[espaço HD] por Gabriela Durante, a “charmosa” DJ Penélope do Bar/Livraria ‘Café Com letras’

“Lisa Ekdahl sings Salvatore Poe” (Lisa Ekdahl, 2002)
Lisa Ekdahl é uma sueca que começou com música Pop e logo passou para o jazz. Tem uma voz singular e muita leveza, os arranjos são ótimos. Música típica para se ouvir num domingo a tarde. Vale ainda conferir os álbuns "Back on earth" e "When did you leave heaven”.

“Come fly with me“(Michael Buble, 2004)
Michael é um jovem cantor canadense que se lança no jazz com regravações dos grandes clássicos. Sem grandes inovações nos arranjos e na execução, Michael Buble canta para quem quer ouvir o velho swing com uma nova voz.

“Rendez-vous a Saint-Germain-des-Pres” (Cafe de Flore – Vários Artistas, 2003) Uma coletânea do melhor da música francesa das décadas de 50 e 60. Junta, num mesmo disco, artistas como Nico, Serge Gainsbourg, Nina Simone, Eartha Kitt, Paris Combo, entre outros.