[“Abril pra Claro” e, claro, o negócio acabou dando rock, em Recife]
Pela primeira vez, em treze edições, o Abril Pro Rock dedicou parte da sua programação a um concurso de bandas: o ‘Claro que é rock’, evento patrocinado pela operadora de telefonia celular, que vai percorrer oito cidades brasileiras, em sua fase classificatória. Na primeira etapa, realizada na última sexta, marcando o início do Abril Pro Rock 2005, cinco bandas concorreram a um prêmio de quinze mil reais, em equipamentos, além da chance de ir pra Sampa disputar a grande final.
A banda potiguar Bugs que teve a oportunidade de participar de dois outros festivais – M.A.D.A., em Natal, e Porão do Rock, em Brasília, ambos no ano passado – fez sua estréia na capital pernambucana. O power trio esbanja competência, principalmente o vocalista e baixista Paolo, mas acaba devendo um bom refrão, um riff marcante, uma melodia de vocal, algo que realmente fique na cabeça do público e o faça lembrar e querer ver e ouvir mais o som do Bugs. Já a paraibana Star 61 parecia disposta a conquistar os espectadores, e por que não, o primeiro lugar no concurso. Seu espalhafatoso e performático vocalista Flaviano André, travestido num visual que lembrava David Bowie, nos melhores momentos do glam rock, literalmente, deitou e rolou, no palco 2.
Na curta apresentação, manteve bem o equilíbrio entre atitude e música e logo deu pinta de favorita na estréia do ‘Claro que é rock’. Outro concorrente da Paraíba que entrou com garra e barulho de sobra pra brigar pelo primeiro lugar foi o grupo Zefirina Bomba. O vocalista Ilsom, tocando seu violão com um timbre completamente sujo e distorcido, comandou o ataque sonoro do Zefirina. A performance ficou mais bombástica, ao final, quando ele honrou a tradição destrutiva do rock e castigou seu instrumento, que falhara em algumas músicas, batendo-o contra o chão até não sobrar corda sobre corda. Outras duas bandas menos experientes tiveram sua chance na competição sonora: a paraense Suzana Flag e a pernambucana Rádio de Outono. Tanto a primeira, tendo à frente a vocalista Suzanne, quanto a segunda, com a cantoria de Bárbara, ficaram dois pop(s) e meio abaixo das demais, na escala rock. A vencedora acabou sendo mesmo a Star 61, comprovando as suspeitas e a torcida da maior parte da platéia.
E duas grandes atrações rechearam a abertura do APR 2005. Os cariocas do Los Hermanos tocaram de novo sem que os vocalistas Marcelo Camelo e Rodrigo Amarante precisassem, realmente, cantar. É que o apaixonado público deu conta deste recado muito bem, nas dezesseis músicas do repertório, incluindo, “Santa Chuva” composta por Camelo para a cantora Maria Rita, e duas do próximo disco, que agora entrará na fase de mixagem. “O Vento” e “Pois é” ainda podem ter suas letras e nomes alterados e, nesse estágio, fica difícil qualquer fã corresponder com tanta intensidade.
Já o Placebo fechou a noite, após uma série de exigências e frescuras, que incluíram a liberação completa do backstage para que seus integrantes pudessem circular livremente, sem serem abordados e importunados por “fãs-jornalistas” ou algo do tipo. Essa atitude “chiliquenta” se transformou em competência na performance dos ingleses. O show começou com a impactante base seqüenciada de “Taste in Men”, seguida pela sucessão de hits da recente coletânea “Once More With Feeling”. Tocando a nata das suas composições seria difícil fazer um show ruim, embora o Placebo tenha deixado o clima esfriar no abafado Centro de Convenções de Pernambuco, lá pelo meio do set list. A impressão que passou é que, em Recife, eles foram profissionais e, em Paris, pra quem teve a oportunidade de conferir o dvd ao vivo do grupo, foram emocionais. E isso faz uma senhora diferença na hora de classificar um show como inesquecível ou não.
O sábado, como reza a tradição, foi o dia do APR dedicado a todo o tipo de som pesado. A horda “men and women in black” compareceu em menor número que na edição 2004, mas com a mesma disposição. Começou a se agitar com o metal melódico “sem cabeleiras” da banda local Silent Moon. Todo mundo sabe que, assim como em Sansão, a força do metal está nas longas madeixas de seus integrantes. Como esse não era o caso da turma do Silent Moon... Já o Chaosfere(PE) acumulava muitos centímetros de cabeleiras que não foram honrados pelo som atravessado e pouco empolgante do grupo. Os capixabas do Dead Fish, confirmaram seu atual status de banda grande, no palco principal, e prepararam terreno para a mais bizarra seqüência do evento. Nem bem acabara a viagem surf instrumental da banda baiana Retrofoguetes, no palco dois, quando a legião do metal fez ecoar pelo Centro de Convenções o coro: “Massacration, Massacration...” Foi uma cena emocionante e, ao mesmo tempo, capaz de provocar uma pane cerebral! É que atração seguinte era mesmo o Massacration, banda criada para um dos quadros do programa humorístico “Hermes e Renato” da MTV Brasil, justamente, para tirar o maior sarro de todos os clichês do gênero. Os “camisas pretas” ovacionaram a parodia para, em seguida, levar a sério a maior fonte dela – o grupo paulista Shaman. E daí veio a bancarrota de André Mattos e cia. Primeiro, porque em vários momentos o Shaman tocando sério ficou até mais engraçado que o Massacration. Segundo porque a apresentação do Massacration acabou sendo de longe a mais divertida da noite. E o quesito diversão, na música pop, quase sempre supera qualquer outro que sirva pra avaliar a qualidade técnica da performance. Ou seja, tantos anos de estudos dedicados a notas vocais agudas, escalas por minutos e melodias de inspiração medieval, por parte do Shaman, acabaram sufocados pela hilariante esquete musical do Massacration. É difícil que, apesar de ter visto ainda o stoner rock da banda goiana MQN e o Sepultura (cada vez mais previsível e menos surpreendente), o público tenha sobrevivido à noite pauleira do APR 2005, levando consigo algo mais revelador e significativo do que os versos de “Metal Bucetation” da turma de Hermes e Renato: “All the nation, stop the punhetation...” Depois de uma gozação dessas, ou o fã de metal deixa de encarar o estilo como se fosse uma religião ou fica ainda mais ortodoxo e passa a escutar apenas os lados b do Krisiun.
A bonança chegou com a terceira e última noite do festival. Os pernambucanos do Superoutro abriram a seqüência, seguidos pelas arrastadas apresentações do Gram e do projeto The Legendary Tiger Man, “banda de um homem só” criada pelo português Paulo Furtado. A intenção da segunda era soar como diferente mistura de clássicos do blues e Suicidal Tendencies mas, em tempos de Jack e Meg White, ficou com uma cara de The Lengendary Embromation Without Stripes. O grupo Volver garantiu bons e inspirados momentos roqueiros, em seguida, apesar do som embolado, no palco 2. Daniel Beleza e os Corações em Fúria também estiveram por lá, pra exorcizar os demônios da noite anterior, com humor ácido, veia punk e estética andrógina. Daniel Beleza sentiu a boa energia do público e desceu para cantar com ele uma versão quase hard core de “Frevo Mulher”. A ala rock da derradeira noite teve também a presença comportada e o show asséptico do Leela. Por outro lado, quem cuidou da assepsia da mpb foi o Mombojó que chegou a ser sonífero, principalmente, durante a participação de Arto Lindsay, com seus espasmos guitarrísticos. DJ Dolores usou sua Aparelhagem, como se fosse um desfribilador para reanimar os corpos presentes. Enquanto, a Orquestra Manguefônica – projeto que reúne Mundo Livre S/A e Nação Zumbi numa jam session manguebit – fez a celebração final se estender por algumas improvisações desnecessárias, costuradas com momentos mágicos, entre eles, a desaceleração e transformação de “A Cidade”(do cd “Da Lama ao Caos”), num funk novo, carregado e bem distante do arranjo original, e uma rápida passagem por “London Calling” do Clash. Caranguejada pop agora, só no ano que vem. (Terence Machado)
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