[nº 5 - Enquanto a mídia não é democrática, a música pode ser independente]
“Independência ou morte!”. Se no plano político, o célebre mote de D. Pedro I não encontrou até agora sua razão na prática, é possível pensar no jargão ao analisar a indústria musical brasileira atualmente. Claro que as duas coisas( indústria e política) são dissociáveis, mas é possível encontrar caminhos paralelos ao tradicional esquema de funcionamento do mercadão. São justamente estas vias marginais que renovam e diversificam a música popular brasileira, afinal, se a única música disponível no mercado fosse a fabricada nas grandes gravadoras - salvo poucos exemplos- poderíamos estar diante do juízo final. Pode parecer uma visão negativa, mas justificada hoje pela limitação criativa e pela covardia das grandes mídias em oferecer ao público um fast food musical tão sem gosto quanto previsível. Uma fidelidade explícita as regras do mercado, que se reflete no jabá, nas bandas “genéricas” , nas celebridades instantâneas, entre outros.
A questão é: independência pode significar democracia, traduzida como a possibilidade do maior número de pessoas terem acesso a uma diversidade musical que existe para ser explorada, desde que esta esteja disponível para o público. Enquanto isso não acontece, existe a opção do músico, do público e até mesmo das gravadoras, entre se sentirem reféns ou fazerem seu próprio cardápio. Escolhida a segunda opção, a independência existe sim, para os que se propõem a fazer música sem concessões ou fórmulas. O que não significa elitismo ou incapacidade de se comunicar com o grande público: é possível que seja apenas honestidade com o próprio trabalho, atitude que muitas vezes é interpretado, brasileiramente, como “coisa de otário”. A independência também está nas pequenas gravadoras e selos, que antes de serem exageradamente categorizadas como suicidas ou heróicas, podem ser vistas apenas como profissionais. Gente que consegue produzir muito, com pouco dinheiro ,mas com fartura de idéias, e que em alguns casos consegue se equiparar seus produtos em qualidade técnica às majors. E, principalmente a independência do público em relação as grandes mídias, que se reflete na busca de novas informações e naturalmente, consumi-las.
Com isso, fecha-se um círculo que, aos poucos, pode sobreviver “constrangindo o mercadão”, como já afirmou Lobão , um dos bem sucedidos exemplos de uma trajetória que hoje segue, a seu modo, paralela à indústria. Talvez seja isso mesmo: a independência pode não ser a solução - ingenuidade pensar que os privilégios concedidos por uma grande empresa( como divulgação) podem ser ignorados- mas, por hora, é um bom veneno para a monotonia vigente no mundo das majors . Veneno este que pode ser ignorado agora, mas que, cedo ou tarde, terá de ser percebido. A partir daí, o jogo pode mudar. (TP)
[velho esquema]
Stevie Ray Vaughan And Double Trouble
“Coundn’t Stand The Weather”
Em qualquer discoteca respeitável, você encontra uma seção destinada aos mestres da guitarra. Com certeza, lá estarão discos de Jimi Hendrix e Eric Clapton. Indo um pouco além, é possível que um ou mais álbuns do texano Stevie Ray Vaughan também estejam na prateleira. Se a coleção for de algum guitarrista, “Couldn’t Stand The Weather” aparecerá em posição privilegiada. Tão à vista, quanto outros dois primores de Stevie – o debut “Texas Flood” e o derradeiro “In Step”. Mas, entre as duas extremidades da sua discografia, este shaman do instrumento conseguiu estreitar a comunicação espiritual com Hendrix, em “Couldn’t Stand The Weather”.
O ritual guitarrístico começa na abertura instrumental “Scuttle Buttin’”, que todo mestre das seis cordas desejaria ter feito. A faixa-título vem em seguida, anunciando a tempestade que se aproxima. O espírito do velho Jimi baixa de forma acachapante, nervosa, beirando um surto epilético, na clássica “Voodoo Chile(Slight Return)”, num dos raríssimo casos em que a reinvenção chega a um patamar próximo da original. Pronto! A cerimônia alcançou seu ponto mais alto. Depois de evocar, receber e transmitir as energias daquele que foi pro além carregando o título de “o melhor guitarrista de todos os tempos”, Stevie Ray Vaughan ainda conduz “Cold Shot”, um shuffle arrastado, genialmente bluesy. E pra todo mundo entender porque o texano foi um dos mais iluminados, principalmente, no território blues, ele ainda destila as notas e os acordes sofridos da sublime “Tin Pan Alley” e seus contagiantes nove minutos e dez segundos. Para um disco que começou com um rock instrumental inspiradíssimo e passou por tantos momentos mágicos, um jazz discreto cai bem pra encerrar a seqüência.
Um talento do tamanho de S.R.V. só poderia mesmo ser interrompido por uma estupidez qualquer como uma overdose ou, aqui no caso, uma montanha artificial para prática de esqui no gelo não prevista na rota do helicóptero destinado a levar pra casa Eric Clapton. Como sacrificar o “deus da guitarra” poderia ser a maior das heresias, o destino preferiu mostrar o caminho das nuvens para Stevie.(TM)
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