[esquemaNovo]

Versão virtual da coluna [esquemaNovo] sobre música pop, produzida por Thiago Pereira e Terence Machado e publicada, todas às quintas no jornal "Hoje em Dia".

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Local: Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil

Pai, católico não praticante, taurino (por teimosia, hehehe), cruzeirense não ortodoxo, ainda jornalista, ex-baterista com recaídas frequentes, ciclista "pós-amador".

segunda-feira, janeiro 24

[Retrospectiva 2004]

Se o ano passado a palavra hype deu o tom, em 2004, as novidades dividiram a atenção de imprensa e público com veteranos. Brian Wilson é a melhor confirmação dessa tese: um dos melhores arquitetos da música pop fez de 2004 sua ressurreição musical completa, lançando dois projetos musicais distintos. O primeiro foi o fraco “Gettin’ Over My Head”, seu primeiro trabalho de inéditas desde “Imagination”, de 97, que traz como único grande atrativo um dueto (“A Friend Like You”) com o “rival” Paul McCartney. O segundo, ”Smile”, é exatamente o oposto, onde o beach boy retoma os trabalhos iniciados em 67 e lança, definitivamente, aquele que era chamado de “o maior disco perdido” da história do rock. Talvez, longe do calor da hora, a história possa ser outra, mas “Smile” deixa quaqluer ouvinte de música pop...sorrindo.

Outros três artistas de carreira praticamente inquestionável voltaram a lançar discos em 2004. “Around The Sun” traz alguns dos habituais acertos do R.E.M., mas no saldo final é uma das maiores decepções do ano (assim como o cansativo “To The 5 Borroughs”, dos Beastie Boys) - fortíssimo candidato ao pouco desejado título de pior disco da carreira da banda. Parece que faltou o que dizer, a Michael Stipe e companhia. O mesmo risco corria “How To Dismantle an Atomic Bomb” do U2, já que este seria o disco de rock que eles vinham prometendo há muito tempo. Bem, não foi, mas com músicas do quilate de “Miracle Drug”, “Love And Peace And Else” e “One Step Closer”, nem precisava ser. E para quem ainda está preocupado com a promessa dos irlandeses, leva de quebra “Vertigo”, com uma guitarra endiabrada, relembrando o nervoso The Edge dos primeiros álbuns. Mas quem roubou as capas de revistas e publicações especializadas foi Morrissey: além de lançar o excelente “You Are The Quarry”, voltou a fazer turnês (na Argentina, inclusive, uma bola incrível comida pelos produtores brasileiros), carregando consigo além do ótimo novo repertório (“First Of The Gang To Die”, “America”) clássicos dos Smiths como a monumental “How Soon Is Now”. Parte da safra anos 90 compareceu bem com PJ Harvey (“Uh Huh Her”, disco que melhora com o tempo), Wilco (o irregular e difícil “A Ghost Is Born”) e Mark Lannegan, com “Bubblegum”, além de coletâneas de Teenage Fanclub e Primal Scream.

Longe da “terra de gigantes”, sim, apareceram boas novidades. Brincando de ser os Strokes, o bando escocês do Franz Ferdinand compôs um dos mais contagiantes hits do ano – “Take Me Out”. Nem a trupe de Julian Casablancas conseguiu uma composição do mesmo quilate no quase decepcionante “Room on fire” do ano passado. As demais faixas do cd de estréia do Franz Ferdinand mantém um bom fôlego criativo, mas não conseguem a eficácia pop do mega hit. Ainda mais pop e equilibrado que o trabalho dos escoceses foi outro respeitável debut – o dos canadenses do Scissor Sisters. Eles brincaram a vontade no universo pop, viajando por várias órbitas, de Elton John a Bee Gees, e com isso despressurizaram até a cabine de um “astronauta” respeitável, o Pink Floyd. “Comfortably Numb” deixou a psicodelia do rock progressivo setentista pra ir parar nas pistas de dança dos embalos de sábado à noite. Fora essa molecagem em ritmo de androginia, as irmãs tesoura emplacaram uma das melhores aberturas de 2004 – a faixa “Laura”. Picotando influências escancaradas e depois montando um quebra-cabeça dos mais interessantes, os australianos do Jet se lançaram na concorrida e cruel feira de especiarias do pop. AC/DC, Stones, Beatles e muitas outra peças foram jogadas na mesa e a tarefa de reuní-las do começo ao fim do cd “Get Born” é das mais divertidas. Destaque para a balada “Look What You’ve Done”. De qual álbum dos Beatles teria saído essa música? Do Abbey Road, provavelmente.

Na música nacional, como boa parte dos estabelecidos ficou na toca, destacam-se boas surpresas como o veteraníssimo Arnaldo Baptista lançando finalmente seu “Let It Bed”. O projeto estava há alguns anos engavetado na mente mutante e ganhou força na produção de John, pupilo do Pato Fu. Para ficar nos extremos, o novíssimo Mombojó (recifenses na média dos 19 anos de idade) inverteu o título de seu trabalho (“Nadadenovo”) inserindo samba, trip hop, surf music e jovem guarda no mangue. Herdeiros fiéis do movimento que comemorou 10 anos com lançamentos especiais, como o DVD “Propagando” da Nação Zumbi e a essencial caixa “Bit”, que recapitula os quatro primeiros discos do Mundo Livre S/A. para ficar em dois extremos. A revista Outracoisa (responsável pelos discos de Arnaldo e Mombojó) provou a competência de sua proposta editorial, farejando outras novidades de todo o país como a matilha sulista Cachorro Grande, o carioca Rogério Skylab (com a pérola “Fátima Bernardes Experiência” – cortada de última hora do cd encartado na revista, por razões óbvias) e a dupla goiana Réu e Condenado.

Goiás também é sede da gravadora Monstro, que em 2004 chutou para escanteio qualquer possibilidade do Estado ainda estar atrelado a surrada pecha de terra dos sertanejos. E a décima edição do festival Goiânia Noise cuspiu na cara das multinacionais do disco uma leva pulsante de trabalhos produzidos na independência, com empenho e profissionalismo convincentes. Pra não repetir os melhores lançamentos do espectro da Monstro Discos, dissecados na edição anterior dessa coluna, vale ressaltar o cuidadoso e invejável disco de estréia do Jumbo Elektro. Quem dera se as grandes gravadoras tivessem colocado nas lojas, pelo menos, meia dúzia de novidades nacionais do mesmo nível!

Mais do que rolou de melhor em 2004, é só espiar as listinhas aí de baixo onde a coluna Esquema Novo divide suas preferências com convivas especialíssimos:

Gastão Moreira (programa “Gasômetro” – Rádio Atlântida / Florianópolis-SC)

Músicas 2004
Internacionais

“I died in a mall” – Kissing Tigers
“Primitive” – Ambulance ltd.
“Mary” – Scissor Sisters

Nacionais
“É preciso dar vazão aos sentimentos” – Bidê ou Balde
“A Caixa” – Daniel Beleza e os Corações em Fúria
“Frigobar” – Kratera

Discos 2004
Internacionais

“Ambulance ltd.” - Ambulance ltd.
“Now here is nowhere” – Secret Machines
“Scissor Sisters” - Scissor Sisters

Nacionais
“Daniel Belleza & os corações em fúria” - Daniel Belleza & Os Corações em Fúria
“Start your own revolution” - Nitrominds
“Meia noite no século XX” - kratera

Shows 2004
The Mars Volta
Primal Scream
Mundo Livre S/A

Thiago Pereira (produtor coluna Esquema Novo/ programa Alto-falante)

Músicas 2004
Nacionais
“Tormenta” - Wado
“Queda Livre” – Dr. Cascadura
“Missa” - Mombojó

Internacionais
“King’s Crossing” - Elliot Smith
“The Rat”- The Walkmen
“Take Me Out”- Franz Ferdinand

Discos 2004
Nacionais
“A Farsa Do Samba Nublado” - Wado
“Nadadenovo”- Mombojó
“As Próximas Horas Serão Muito Boas” - Cachorro Grande

Internacionais
“From A Basement On The Hill”- Elliot Smith
“You Are The Quarry”- Morrissey
“A Grand Don’t Come For Free”- The Streets

Shows
Primal Scream
The Mars Volta
Pixies


Ludmila Azevedo (repórter e produtora programa Agenda)

Músicas 2004
Nacionais

“Aganjú” - Bebel Gilberto
“The Sense of Movement” - Valv
“Fátima Bernardes Experiência” - Rogério Skylab

Internacionais
“Chip Chip” - María Esther Zamora (trilha sonora Diários de Motocicleta)
“I’m not Sorry” - Morrissey
“Who the fuck?” - P. J Harvey

Discos 2004
Nacionais
Valv - The sense of movement
Cachorro Grande - As Próximas horas serão muito boas
Mombojó - Nada de novo

Internacionais
“Uh Huh Her” - PJ Harvey
“Medulla” - Björk
“Franz Ferdinand” - Franz Ferdinand

Terence Machado (produtor coluna Esquema Novo / programa Alto-falante)

Músicas 2004
Nacionais
“Que Loucura” – Cachorro Grande
“Fátima Bernardes Experiência” – Rogério Skylab
“Queda Livre” – Dr. Cascadura

Internacionais
“Take Me Out” – Franz Ferdinand
“Pretty (Ugly Before)” – Elliot Smith
“Tell Me Something I Don't Know” – The Thrills

Discos 2004
Nacionais

“As Próximas Horas Serão Muito Boas” – Cachorro Grande
“Nadadenovo” – Mombojó
“Freak to meet you” – Jumbo Elektro

Internacionais
“From a Basement on The Hill” – Elliot Smith
“Franz Ferdinand” – Franz Ferdinand
“You Are The Quarry” – Morrissey

Shows 2004
The Mars Volta
Orchestra Morphine
Pixies

[nº 20 - Alternativa Monstro!!!]

A produtora e selo goiano fechou 2004, com um respeitável catálogo de 60 títulos, dois festivais anuais – o Bananada e o Goiânia Noise – e quase toda uma cena aos seus pés. Isso ficou evidente na décima edição do Goiânia Noise que embalou a cidade, durante três dias, há dois fins de semana, com um diversificado repertório e cerca de 40 artistas se apresentando nos dois teatros do Centro Cultural Martim Cererê.

O melhor foi constatar que o público que, praticamente, lotou o local nos três dias de evento, estava lá para ver e rever bandas de estilos variados, conhecidas ou não. Viva a curiosidade! E pode-se dizer que a Monstro também é responsável por isso. É que a produtora, desde o início, vem promovendo festivais e lançando vários discos, sem estar focada em apenas um gênero musical. A última leva de lançamentos do selo, que veio à tona na ocasião do Goiânia Noise 2004 escancara essa “tática Monstro” de apostar na diferença.

Sim, é claro que o primeiro foco do selo esteve nas bandas de rock garagem mas, aos poucos, essa postura mudou. Entre os cds mais recentes da Monstro, dois são de música instrumental, um passeia entre o pop e o brega e um finca o pé no rock garageiro, com letras em inglês. “Bad Ass Rock ‘n roll” é o segundo disco do MQN, banda local liderada por um dos “quatro monstrengos” – o produtor e vocalista Fabrício Nobre. O cd mostra uma nítida evolução do stoner rock cuspido pelo quarteto. É fácil um dos melhores lançamentos do rock “made in Brasil”, em 2004. E um ouvinte desavisado pode jurar que a faixa “Let It Rock”, por exemplo, é um hit de alguma banda californiana. Incrível perceber também o padrão e qualidade de gravação que os artistas do circuito independente têm alcançado.

O terreno instrumental, por sua vez, está muito bem representado por outros dois lançamentos recentes de lá. Um é “Ativar Retrofoguetes”, a tão esperada estréia dos baianos do Retrofoguetes num cd completo. O grupo mistura surf music com psychobilly e tem uma pegada poderosa. Anos de estrada e teste de dois dos integrantes do Retrofoguetes, à frente do finado Dead Billies, contribuiram e muito pra isso. Deixando possíveis vocais, quem sabe pra outra hora, os gaúchos do Pata de Elefante pisam num solo adubado com influências bem distintas, que vão do folk rock psicodélico dos Byrds até o funk do lendário Funkadelic. Os 15 temas instrumentais registrados no 1º disco do grupo mostra uma coesão impressionante para um trio tão novo. Bem vindos ao front!

Do sul para Goiânia e, daí, para o resto do Brasil, outra boa novidade é o rock escrachado, curto e grosso dos Irmãos Rocha. Eles soltaram há pouco pela Monstro “Ascensão e Queda dos Irmãos Rocha” – um cd com 20 faixas, sendo que apenas uma delas ultrapassa a “barreira” dos três minutos e a grande maioria não chega aos dois minutos de duração. Enquanto o Pata de Elefante se diverte compondo temas trabalhados, o quarteto André, Mauro, Raul e Bel Rocha desembaraçam ao máximo todos os nós da linguagem pop. As letras são bem humoradas e repetitivas, como a linha rítmica e os arranjos das suas “vinhetas musicais”.

Bom humor é também o que norteia “Clube Quente dos Sapatos Bicolores” do Sapatos Bicolores. O visual adotado por esse trio é bem anos 50 e o som remete ao rockabilly, à jovem guarda e ao pop brega brasileiro. Esse é o primeiro lançamento da Monstro no formato digipack (com o cd muito bem “embalado” numa luxuosa caixinha de papelão, ao invés da tradicional caixa de plástico) pra encher os olhos e os ouvidos!

Esses são apenas os discos mais recentes produzidos pela competente trupe, lá de Goiás. Autoramas(RJ), Astronautas(PE), Barfly(GO), Detetives(SP) e muitos outros já ganharam o mercado com o incentivo e iniciativa da Monstro Discos e estão pipocando por aí. E olha que a produtora é apenas uma das várias plataformas de lançamento espalhadas pelo Brasil.

Passou da hora de muita gente procurar novidades, bem distante das falsas promessas das majors, antes que o Monstro do mercado independente fique grande demais!!! (T.M.)